ESCRAVOS CONTEMPORÂNEOS
Meu amor é cartão de crédito
dividido em quarenta e oito
prestações.
E o meu carro se realiza
Em sonhos de montadoras.
Paixão de plástico,
Orgasmos de vitrine,
Prazer de refrigerante.
A minha poesia é concreto
polietileno, borracha de pneus na
estrada.
A minha escola atrofia-nos.
Diplomação de viseira,
em troca da esmolinha recheada.
Permuta do salame ao presunto.
Minha cota do chicote é cibernética.
Pelourinho virtual.
Meu chicote é de ouro,
ouro que dói no couro,
e brilha mais que o do vizinho.
Minha mulher é de alumínio,
meus filhos são chips,
minhas amantes são softwares,
programados para reproduzir
o torpor da TV,
risos sem graça em cérebros de ameba.
Morro pelo meu time
na arena dos leões de ferro.
Meu ferro, que para lá vale um,
E para cá vale mil.
Sou programado para ser feliz
entre o intervalo de 12 horas de
trabalho,
6 horas de insônia,
3 horas de preocupações
com contas a pagar,
o ladrão a me espreitar,
o super-hiper-mega-supermercado a me
furtar,
e o médico a me dizer,
que se eu não parar de fumar vou
morrer.
E me sobra meia hora de cerveja e
cachaça,
para eu ser feliz e esquecer quem sou.
Pois sou feliz quando dispo-me do
robô.
E despreocupado, canto uma cantiga de
amor.
Tela: "Operários de 1933",
de Tarsila do Amaral
Site dessa imagem:
http://ietarsiladoamaralrs.blogspot.com.br/
[Mauro Brandão - 20/11/2012]
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FAKE
Faz-de-conta, fake a face.
Faz-se de canto, faro fake fadado a
facear.
Facetar, escamotear,
Faca amolada, fake amotinado...
Quantos de ti são apenas um?
Deveras saber, quantos fakes.
Quantas faces, quantas facas?
Mil faces em um fake só...
Fake de si, fake de muitos.
Muitos em um, um em muitos.
Face, fake, facetas, faceiros.
Tu és nós, nós somos um!
[Mauro
Brandão - 26/10/2012]
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CICLETERNO
O homem se perde no cheiro da mulher.
A mulher se perde no cheiro da vaidade.
A vaidade se perde no cheiro do dinheiro.
O dinheiro se perde no cheiro do homem.
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CONFIDÊNCIA DO CAETEENSE
Mauro Brandão
Talvez ainda, meu neto,
filho do meu pai,
comemoraremos o dia
calendarial da natureza com merecidas festas.
Se fossemos puros como
animais, nem precisaríamos comemorar.
Comemoraríamos no palco
da existência assim, do jeito que é.
Só!
Mas temos dinheiro para
nos iludir, e o dinheiro tem Poder!
Poder de destruir,
Poder de arrancar
lágrimas de onde não deveriam arrancar,
De fazer falsas belas
loiras carregarem ouros verdadeiros em seus braços e pescoços,
para ostentar os buracos
que os homens escavam,
e que jamais virarão
árvores, águas, pássaros, coelhos, capivaras, aranhas,...
e jamais um belo quadro
que nem todo dinheiro que já se fabricou poderá nos fazer deslumbrar.
O ouro e ferro no pescoço
das falsas belas e gostosas loiras dos rodeios me faz querer ser Drummond,
que pingou suas letradas
lágrimas nos cortes desérticos da outrora florida Itabira.
E que das lágrimas se fez
o poeta além daquilo que já não vale.
Homens te agridem por
achar dinheiro nas pedras vermelhas.
Homens te desdenham por
enxergar dinheiro debaixo das cascatas.
Homens se perdem no mar
de dinheiro por acreditarem serem animais algo (algo?) sem importância.
Homens vendem alma para
alimentarem-se de dinheiro.
Homens alimentam-se de
dinheiro em troca de água e ar.
Mas homens jamais
comprarão palavras vivas e eternas.
E enquanto a carne das
falsas loiras belas apodrecem no ouro que ostentam em seus pescoços e braços.
As palavras-vivas,
águas-vivas, queimarão a ganância humana que respira e bebe dinheiro.
E assim, meu poeta das
Itabiras, anjo Drummond!
Me permita, só agora, ser
Você!
Para que eu, sendo você,
seja escutado nas entranhas profundas da terra.
E das entranhas profundas
da terra, grite e desentupa os ouvidos dos homens cheios de dinheiro e vazios
de alma.
CONFIDÊNCIA DO ITABIRANO
Carlos Drummond de
Andrade
Alguns anos vivi em
Itabira.
Principalmente nasci em
Itabira.
Por isso sou triste,
orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de
ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de
ferro nas almas.
E esse alheamento do que
na vida é porosidade e comunicação.
A vontade de amar, que me
paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas
noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que
tanto me diverte,
é doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas
diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro,
futuro aço do Brasil,
este São Benedito do
velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta,
estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça
baixa...
Tive ouro, tive gado,
tive fazendas.
Hoje sou funcionário
público.
Itabira é apenas uma
fotografia na parede.
***
Morreu...
Morreu de inanição,
por matar seu alimento.
Morreu por
matar o debate, a liberdade.
Morre-se de
fome e de ideias.
Morre-se na
ausência de ideais e de ausência de fome.
Há de se ter
fome, de pão e de justiça.
Fome de vontade
e de brilhar.
Fome de pensar,
do pensar do outro.
Pois só se
pensa o outro em si.
Pois em si,
cabe todo o universo e o outro.
Assim, se o
outro não vê o outro.
Morre o outro
na ausência do outro.
E nenhuma
retórica vai nos convencer.
Que novo não é
só uma palavra vazia.
Novo é estrela
que brilha nova no céu das vontades.
Vontade de
fazer de novo, tudo aquilo que envelheceu.
Envelheceu na
alma de quem não quer o novo.
Mesmo que diga
que é novo e vem para o novo.
Por isso, só
será novo aquele que se abre.
Abre à criança,
ao jovem e ao velho.
Abre-se! Se
abre ao novo que é velho e é sempre.
E se não se
abre, morre, morre-se e se morre!
[Mauro Brandão]
Site desta imagem: http://www.vidainteligenteonline.com/colunas/44,sobre-edital-profissional-e-pa-de-cal.html
***
MERDADORIA
O
dinheiro é merda...
que
trás dinheiro...
que
trás merda...
que
atrasa o dinheiro...
que
atrasa a merda...
que
vem através de merda...
que
vem através de dinheiro...
que
traz merda...
que
traz dinheiro...
que
trai merda...
que
trai dinheiro...
que
traga merda...
que
traga dinheiro...
que
entrega merda...
que
entrega dinheiro...
que
entra merda...
que
entra dinheiro...
que
entre merda...
que
entre dinheiro...
que
atrela merda...
que
atrela dinheiro...
que
treta merda...
que
treta dinheiro...
que
trata merda...
que
trata dinheiro...
que
trota merda...
que
trota dinheiro...
que
tritura merda...
que
tritura dinheiro...
que
frita merda...
que
frita dinheiro...
que
trafica merda...
que
trafica dinheiro...
que
trancafia merda...
que
trancafia dinheiro...
que
tramoia merda...
que
tramoia dinheiro...
que
treme merda...
que
treme dinheiro...
que
trama merda...
que
trama dinheiro...
que
tramita merda...
que
tramita dinheiro...
que
tremula merda...
que
tremula dinheiro...
que
emula merda...
que
emula dinheiro...
que
simula merda...
que
simula dinheiro...
que
sinaliza merda...
que
sinaliza dinheiro...
que
assinala merda...
que
assinala dinheiro...
que
inala merda...
que
inala dinheiro
que
anasala merda...
que
anasala dinheiro...
que
assola merda...
que
assola dinheiro...
que
solicita merda...
que
solicita dinheiro...
que
excita merda...
que
excita dinheiro...
que
incita merda...
que
incita dinheiro...
que
entala merda...
que
entala dinheiro...
que
farta merda...
que
farta dinheiro...
que
falta merda...
que
falta dinheiro...
que
falta
faz
a
farta
merda
do
dinheiro
!
[Mauro Brandão
- 19/07/2012]
***
Oração ao Governo de deus.
Oh deus que manda em tudo, e que
pode fazer do mundo uma bola de fogo.
Livra-nos, oh deus-prefeito,
deus-deputado, deus-presidente.
Dos arrogantes, dos chorões, dos
cagões, dos ímpios da consciência.
Livra-nos dos mestres-burros, dos
que fizeram orelhas em diplomas.
deus governante de tudo, faça-os
entender a democracia,
limpe-os as mentes, mostrem-lhes as cagadas que andaram
fazendo.
Oh deus que transformará em
inferno àqueles que não o seguirem.
deus teocrático de uma terra
socrática e de mentes oligopolizadas!
Valei-nos mais das nossas
capacidades do que dos erros dos outros.
deus que manda em mim, traga-nos
capim.
deus que manda em todos,
traga-nos uma poça de lodo.
deus que me faz olhar no espelho,
e me faz ver orelhas grandes, e
quando falo, ouço relinchos.
oh deus! me faça entender porque,
ao invés de melhorar, a minha tendência é só piorar.
Amãe!
***
Um dia da Mulher
Não é um dia. É o dia!
Um dia quem sabe, não precisará ser o
dia?
O meu olhar nunca as entenderá...
Mas o meu amor nunca acabará!
Já amei, amo e amarei-as!
Mulher, mulheres... uma diferença além
do sexo...
Irresistível ao aroma e ao paladar.
Pode ser de A a Z, mas é alfa e ômega!
Pode ser acima... ou abaixo...
ponteiros de balança...
Que se quebrem as balanças, e que
exaltemos as estrias!
A mulher é mais do que um modelo
anoréxico!
É mais do que uma silhueta geométrica
da Playboy!
A verdadeira lava a roupa na bacia da
beira do rio.
A verdadeira assume quando todos
desertam e deserdam.
O meu olhar não alcança a dimensão dos
seus olhares.
Por isso enxergo-as assim! Tão
miopiamente...
Por isso só posso reverencia-las.
Como injustamente não reverencio a
minha própria mãe.
À cada mulher, a todos os dias, ao seu
dia.
Ao seu dia, mulher de todos os dias.
***
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